sexta-feira, 29 de janeiro de 2010

De Gotemburgo a Alverca



A Suécia é a melhor coisa que aconteceu ao mundo desde que se definiram fronteiras: boa comida, boas mulheres... bom tempo é mais difícil, mas eu até gosto de neve. Mas - e isto é importante - boa pop. Não só por parte dos consagrados The Knife ou da bonita Lykke Li (sim, omito deliberadamente os ABBA e os Roxette porque 1) não sou a minha mãe e 2) aqui somos todos bué indies), mas também por culpa destes senhores de nome facilmente pronunciável e que ainda assim oferece dúvidas sobre qual seja. Jájá? Jê-Jê? Jotajota?

Vem este post depois de ter saído (na net, lol) o novo registo, simplesmente intitulado no. 3, que, tal como o seu precedente (o no. 1 foi apenas single), é composto por canções breves e melódicas (o tempo de escuta não ultrapassa os 28 minutos), com um pé na electrónica e outro na praia, rebuçadinhos (adoro quando se referem à pop feita assim como rebuçadinhos) para uma noite ao luar, samples de golos do Ibrahimović (o melhor uso de um sample desde Zomby e a remix ao Street Fighter). Não é um disco para salvar ninguém, nem para durar na história musical: mas que bem que sabe enquanto aqui estamos e somos jovens.

Tira-se também daqui aquele que será, com certeza, um dos melhores momentos de um disco de 2010: a abertura com My Life, registo solene quase soul, um minuto e cinquenta e sete segundos para trazer lágrimas aos olhos de românticos e hips-ROMÂNTICOS, APENAS. Não haverá potencial single como houve From Africa To Malaga no primeiro registo, mas há And Now, Golden Virginia e You Know para animar iPods e leitores mp3 com símbolos do Benfica.

sábado, 23 de janeiro de 2010

They called you a John Difool



Análise ao concerto aqui.









OK, fora de brincadeiras: há poucos artistas dos quais se pode dizer "foda-se, passei o gig todo com um sorriso de orelha a orelha". Hoje foi um desses casos, não (só) por toda a aura de mistério que o envolve, mas também pelo assalto sonoro que se viveu no Maria Matos; Jandek (trataremos o projecto como se fosse uma pessoa) é homem de poucas palavras e recursos, prefere palcos parcamente iluminados, canta (ou não) as agruras da vida, o sofrimento, a solidão, o desespero - o verdadeiro cliché do artista torturado e do emo moderno. Mas há que reconhecer: mal se senta e dedilha a guitarra desafinada, não há um único olhar que não esteja posto sobre ele e seu negrume, mesmo que, do outro lado do palco, estejam artistas convidados igualmente violentos no approach que fazem à (sua) música.

Fica marcado o concerto pela enorme actuação do saxofonista Peter Bastien: ora furiosamente tribal, ora causticamente urbano, foi ele que, a haver essa possibilidade, roubou o espectáculo ao Sr. Corwood. Compará-lo a John Zorn seria insultuoso, mas não há outro remédio: a brutalidade é a mesma. Nota positiva também para o guitarrista-tornado-pianista André Ferreira e para o trompetista Sei Miguel, os outros dois acompanhantes do insondável (adoro estes adjectivos) Jandek. Tendo em conta a numerosa obra que lançou e o facto de que todos os concertos são diferentes, não há como compará-lo a algo antigo: houve laivos de Bohren & Der Club Of Gore e/ou Kammerflimmer Kollektief, mas apenas isso: laivos. Jandek é Jandek e espera-se que durante muitos anos assim o seja.

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Notas soltas sobre notas soltas



Quando o dubstep explodiu em 2006, e trouxe consigo, entre outros, Burial, Kode9 e Skream, produtores indiscutivelmente awesome, era todo um mundo novo: linhas de baixo arrancadas às vísceras, beats apocalípticos, cidades negras à ressaca do grime. Foi nas pistas o que o sludge foi nos metaleiros: "WHOA, É POSSÍVEL FICAR PEDRADO SEM FUMAR?" (isto não será inteiramente verdade, mas adiante). Para quem estava acabado de sair do techno marado à la Aphex Twin, foi uma oportunidade de ouro para ser ainda mais pretensioso e gozar com a cara dos clubgoers modernos, para quem o Guetta é Deus (vómito) e o White Sensation uma revelação religiosa (foda-se).

Depois de ter ouvido os álbuns dos supra-mencionados, deixei de ligar ao dubstep (lol, trend-hopping). O que não significa que de vez em quando não volte lá: foi o que aconteceu recentemente (e o que motivou mais um excelente (not) texto da minha modesta autoria) com o escutar (^^) do álbum de estreia dos Broken Note, duo de DJs londrino que dá ao já de si pesado estilo uma nova (não sei se alguém já fez isto antes, nem sinceramente me interessa) massa corporal: através do terror do Drum N' Bass. O resultado? O fim do mundo, o abanar dos corpos como se não houvesse amanhã (nem ossos), um álbum tão bass-heavy que faria Lee Perry corar de inveja. Let'Em Hang, War In The Making, Dubversion: faixas que aguçarão a imaginação de qualquer realizador sci-fi esse mundo fora, o triunfo sangrento e brutal das máquinas.

E atenção: há ainda pelo meio uma excelente remistura aos Juno Reactor (ah, os tempos do goa!). De resto, não recomendável a quem só conhece música electrónica das xaropadas que ouve na Viva polaca. Pode ferir sensibilidades. E tímpanos. Mais os tímpanos.

domingo, 17 de janeiro de 2010

Parvo És Tu Se Não Ouves Esta Merda



De vez em quando surgem-nos bandas sobre as quais pensamos "foda-se, onde estiveram vocês durante toda a minha vida?". Os Paavoharju (lol, Finlândia) são uma dessas bandas: algures entre a electrónica Boards-of-Canadiana e a psicadelia solarenga dos Beach Boys (ou, se quisermos ser hipsters e modernos, soam mais a Animal Collective), e com o mesmo espírito no que toca à língua materna que colocou os Rammstein no topo do mundo, este grupo de (supostamente) cristãos ascéticos (mas não é a música um prazer mundano?) canta uma pop cheia de sonhos reverberados, samples de ondas e lua cheia, imagens de neve litúrgica semeando os campos (bem, é possível ser mais pretensioso que isto? Contacta-me Pitchfork). O resultado? Dois discos de qualidade inegável (e invejável) que farão muito boa gente mudar de ideias em relação à Finlândia (metaleiros).

Yhä Hämärää (2005) e Laulu Laakson Kukista (2008) formam o output da banda, e em ambos se encontram as mesmas melodias suaves, experimentalismo folk, uma certa nostalgia sonora da infância, quando é tudo tão bonito que só nos resta sorrir. Acredito que também as letras sejam muito bonitas, mas lá está, Valo Tihkuu Kaiken Läpi parece-me mais um insulto a um tipo chato do que um poema sobre a luz. Ainda assim, nada que impeça a apreciação de alguém. Bem, eu pelo menos apaixonei-me à primeira audição. Hence this post.

Estarão cá, no Festival Músicas do Mundo, em Sines, no próximo verão. Vejam bem: até podem ir ver e contar aos amigos que são muito eruditos musicalmente, até já gostam de "música do mundo". E toda a gente olhará de boca aberta: "uau". E criarão blogues. O mundo precisa de blogues.

sábado, 16 de janeiro de 2010

Air France



Coliseu. Passagem por três seguranças até entrar no recinto. Calor, muito. Lá dentro, casais aos beijos, sonsos de máquina fotográfica em punho, hipsters até onde a vista alcança. Há um leve cheiro a ganza, mas essa é omnipresente em tudo o que é concerto. As luzes fariam Ian Curtis virar as tripas do avesso.

Entra em cena George Pringle. Não se deixem enganar pelo nome: é uma mulher. Fodível. Eu pelo menos ia lá. Único equipamento, um Mac e o micro. Não precisa de mais: beats meio synthpop como pano de fundo, conta histórias, prosas absolutamente nonsense. O público estranha: mas não entranha, e nota-se. Estariam à espera de uma qualquer Robyn ou Róisín, mas calhou-lhes uma poetisa. Ainda se abanaram umas ancas e ouviram-se aplausos no final de cada tema, o que se justifica da seguinte maneira: a tipa é boa. Tivesse outro nome e fosse abrir o concerto de outra banda, teria acontecido algo diferente. Mas também o público é diferente hoje (para melhor). Ressalva-se deste mini-concerto(?) uma homenagem sentida aos LCD Soundsystem.

Passados alguns ajustes no som, vêm Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunckel, mais conhecidos como Air, mais conhecidos como aqueles-tipos-da-sexy-boy, vestidos de branco da cabeça aos pés, algo que o Mika (ou um sósia perfeito), à minha frente, parece ter adorado. Começam pelos temas de Love 2, álbum editado no ano passado. Do The Joy. So Light Is Her Footfall, linda. A primeira grande euforia chega com Cherry Blossom Girl , de Talkie Walkie, 2004. Por esta altura já toda a gente se rendeu à classe dos senhores: não há uma nota fora do sítio, há o tradicional "obrigado" em vocoder-friendly. Não houve Playground Love, mas houve Highschool Lover. Não houve All I Need, houve Kelly Watch The Stars versão headbang. E houve encore, e houve orgasmo para 90% do público, sobre o qual não havia dúvida: só tinham ido ver Sexy Boy ao vivo. E a dupla não desiludiu.

Para terminar: juro pelo Deus em que não acredito que o próximo filho da puta que me arruinar a vista do palco com a merda do telemóvel a filmar vai para casa com ele enfiado no




(não arruinemos uma banda de bem com frases ordinárias, por favor)

sexta-feira, 1 de janeiro de 2010

Surfing on sine wavves



A pop é uma coisa estranha. Por mais voltas que se lhe , mantém sempre o seu aspecto primordial: melodias simples e directas, um maior cuidado na criação da canção, temas (quase sempre) mundanos de forma a apelar ao público geral. Por mais voltas que se lhe dê (e já lhe deram tantas), continua a ser o medium preferencial no que toca à música: enquanto que na literatura existem estilos demasiado díspares para que se possa definir uma base comum, aqui quase todos os caminhos vão dar à mesma origem. Tudo isto para dizer que os Wavves são uma banda pop, uma excelente banda pop, passe-se o pleonasmo.

E porquê chamar-lhes pop? A escola está lá toda: basta ouvir So Bored, California Goth ou a auto-depreciativa No Hope Kids para logo captarmos a inocência das primeiras bandas surf, a causticidade dos Pixies, a descarga emocional dos MBV, a irreverência teen dos próprios Green Day ou Offspring. Como quase todas as bandas de hoje em dia, seguem à risca o código DIY: álbuns gravados em quartos com vista para o sol, usando programas como o Audacity ou o Garage Band, sem qualquer prezo pela pós-produção: é assim que foi gravado, é assim que é lançado.

Estiveram cá, no passado dia 19. Admito: se se quiser ser neutro, foi um concerto fraco (faltaram muitas das canções que lhes enriquecem o repertório, excepção feita ao hino dos putos aborrecidos de 2009), e a qualidade do som na ZdB não terá sido a melhor. Mas foi impossível ficar indiferente à banda, que entre cada tema e cada elogio a Satanás mostrou que não é mais do que aquilo que aparenta (e que deve) ser: putos na brincadeira, aquele pessoal do secundário que só dizia merda durante as bebedeiras, punks da geração Ipod; uma banda para quem está farto de todo o pretensiosismo e literacia da cena alternativa actual.

O sol abriu-nos os olhos.