segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

White Lies - As I Try Not To Fall Apart

 



Oh, sim, eu percebo perfeitamente que o tipo da Comunidade Cultura e Arte, quando instado a dar respostas concretas sobre as coisas de que gostava, não tenha conseguido balbuciar mais do que um par de palavras. Eu também tendo a ficar extremamente nervoso e amnésico quando me perguntam sobre os discos que me têm caído no goto, porque ouço tanta merda que acabo por me esquecer daqueles a que achei alguma piada (a não ser que o façam via internet, porque aí sempre dá para consultar o glorioso .xls que preencho ao longo do ano). 

Claro que eu não criei um website intitulado "Comunidade Cultura e Arte", nem acho que ser uma agência publicitária glorificada por hipsters seja de alguma forma semelhante a """jornalismo cultural""", mas eu não estou aqui para rasgar na CCA. Estou aqui para rasgar no novo dos White Lies, uma banda que também tende a provocar-me amnésia. É que os confundo sempre com os White Hills, que posso ou não ter visto num Musicbox desta vida (é no que dá ir a concertos para beber cerveja). Pelo que, sempre que leio uma notícia sobre um novo álbum ou um novo single dos White Lies, estou à espera que uma qualquer descarga psicadélica de electricidade me arranque do torpor da vida mundana, ou que pelo menos me faça voltar a ouvir essa coisa a que chamam rock psicadélico. É que eu vivi entre 2010 e 2014 e rapidamente me fartei dessa merda (a culpa é dos Tame Impala. A culpa é sempre dos Tame Impala).

"As I Try Not To Fall Apart" remete-nos para um outro período, não esse, mas aquele entre 2004 e 2007, quando os Bloc Party eram a melhor banda do mundo e os Editors eram algo que, enquanto humanidade, aceitávamos. Porra, até gostávamos daquilo, independentemente da banalidade da coisa (vá, a 'Munich' é óptima, e de certeza que havia outra mão cheia de boas canções dentro daquela depressão pós-fin de siècle pós-"24 Hour Party People" pós-parto pós-ta que te pariu). Mas, amigos, já lá vão quase 20 anos: continuar a soar como tudo o que se fez então, como se a coisa ainda tivesse alguma urgência (algo que é importantíssimo no rock n' roll, e se não a conseguem detectar instantaneamente, então vocês não gostam de rock n' roll), não vos vai fazer mais novos. Apenas vai fazer de vocês aquele género de pessoas que pergunta aos sobrinhos o que é o TiqueTaque. Além do mais, qualquer banda que em pleno 2022 ainda usa como títulos das canções o verso mais entoado dentro das mesmas (os White Lies cumprem uma tríade bonita, e por bonita quero dizer bovina, com 'Am I Really Going To Die' / 'As I Try Not To Fall Apart' / 'I Don't Want To Go To Mars') está claramente a pedi-las (pá, estava a escrever isto enquanto ouvia o disco e eles VOLTAM A FAZER O MESMO na 'There Is No Cure For It', que risota do caralho). 

É por demais evidente que daqui a dois ou três anos os White Lies voltarão a lançar qualquer coisa e eu vou voltar a enganar-me. Por isso, não encarem esta publicação como uma CrÍtIcA áCiDa. É só um memofante. A idade não perdoa e o pretensiosismo também não.

sexta-feira, 14 de janeiro de 2022

Burial - Antidawn

 


Não me interpretem mal. Eu não odeio o Burial. Porra, eu adoro o Burial.

Esperem, talvez "adoro" seja uma palavra demasiado forte. Digamos que eu compreendo o Burial.

Não que seja preciso compreendê-lo para apreciar a música que ele faz. Não é como se compreender o homem, ou as suas ideias, fosse condição sine qua non para botar a tocar a 'Southern Comfort', a 'Near Dark', a 'Ashtray Wasp' ou a 'Dark Gethsemane' (mencionando apenas algumas, para não escrever, naquele estilo muito rockista, que os álbuns e os EPs devem ser escutados do início ao fim, sem paragens). 

Além do mais, como compreender um homem que, ao longo de toda a sua carreira, se tem mantido afastado não dos corredores da fama - porque nunca se poderia ser famoso a fazer a música que ele faz a não ser que houvesse uma qualquer revolução - mas das próprias noções de mediatismo e imediatismo? Como compreender um homem que num mundo onde o Instagram é um poder tem menos que uma mão cheia de fotografias suas espalhadas pela Internet? Como compreender um artista que, aparentando rejeitar a promoção do seu próprio trabalho ("aparentando", porque essa mesma rejeição acaba por agir como promoção ao seu trabalho - o Mark Fisher, dos poucos que o entrevistou, deve ter escrito qualquer coisa gira sobre o assunto), não se deixa conhecer? Quando escrevo "compreendo", é muito possível (ou, admito, inteiramente verdade) que esteja a romantizar a ideia que tenho dele: um gajo tranquilo, sem merdas, que para fugir ao ennui suburbano decidiu compor umas malhas sem preconceito ou pré-concepção, apenas e só porque lhe deu na real gana, sem se lembrar de que por boa parte do mundo ocidental alguém iria ouvi-las e pensar epá, isto faz-me sentir o que sou.

E é por isso que eu digo que compreendo o Burial. Porque ele me faz sentir o que sou: um gajo do subúrbio, não muito afastado do grande centro de decisão, de cultura, de entretenimento - a cidade -, mas afastado o suficiente para que esse centro pareça tão distante que só uma mudança radical no meu modo de vida (como, sei lá, tirar a carta - sabem o que é ser um adolescente nos subúrbios e mal esperar para poder tirar a carta só para poder ir beber copos e ver concertos à cidade?) encurtaria o espaço que vai daqui ao sonho.

Já o escrevi, noutro lado (julgo eu; se calhar disse mas não escrevi), que é preciso ter crescido no subúrbio - entidade estranha e aflita para a qual mil designações existem sem que nenhuma esteja completamente errada - para compreender realmente o Burial. E não apenas durante uma parte ínfima da nossa vida no planeta, mas mais ou menos desde a primeira ganza fumada aos 13 anos até ao primeiro estágio profissional. Mais ou menos desde o momento em que começas a fazer merda com os amigos porque não há mais metafísica no mundo que não a de fazer merda com os amigos para mostrar a toda a humanidade que estás vivo (nesse sentido, outra coisa que também costuma bater bem é o sample usado pelos Radio Dept. naquele pedacinho de magia chamado 'Never Follow Suit'). Mais ou menos desde a primeira vez que foges da bófia até ao dia em que dás por ti no último comboio da noite, depois de horas e horas a tirar notas na faculdade ou a fazer o trabalho de merda que o teu patrão não quer fazer, a olhar pela janela na direcção de todas as fábricas abandonadas, todas as paredes pichadas, todos os candeeiros fundidos que constituem a paisagem que rodeia a tua freguesia, um hotel gigante onde o pequeno-almoço é servido a correr.

Porque das poucas coisas que se sabem sobre o Burial, além do nome, que francamente não interessa - nunca ninguém lhe vai chamar William, ou Billy, ou Sr. Levan - será sempre o Burial -, é o facto de ele ter crescido no subúrbio: Londres Sul, que lá por ter "Londres" no nome não deve deixar de ser semelhante a todos os outros subúrbios de todos os outros países industrializados. Basta isso para pintar um retrato (novamente, eventualmente romantizado) do seu crescimento. Isso, e uma fotografia da escola onde andou. Isso, e esta citação de uma entrevista à Wire:

I was brought up on old jungle tunes and garage tunes that had lots of vocals in but me and my brothers loved intense, darker tunes too, I found something I could believe in [...] My brother might bring back these records that seemed really adult to me and I couldn’t believe I had 'em. It was like when you first saw Terminator or Alien when you're only little. I'd get a rush from it, I was hearing this other world...

É isto - I was hearing this other world - que torna o Burial tão identificável para quem mora no subúrbio. Moro no mesmo bairro há mais de 25 anos e provavelmente não chega à dúzia o número de concertos (falando especificamente de concertos porque eu gosto é de música, e bola, duas coisas também elas, hm, suburbanas) que vi na minha cidade. Não porque tenha ignorado os outros; mas porque simplesmente não houve mais, e dentro dessa dúzia já incluo os espetáculos pimba que todos os anos cá metem em honra do santo padroeiro. No caso concreto do Burial, foi o jungle que lhe abriu as portas, assim como no meu podia ter sido o kuduro ou a kizomba se eu nesses verdes anos estivesse mais interessado em tarraxar que em foder os ouvidos com os decibéis absurdos do metal. Para ele, o jungle não era apenas música: era uma escapatória da sua própria condição, o El Dorado que existia além das paredes carregadinhas de humidade do prédio onde (provavelmente) morava. O jungle e por arrasto as raves constituíam uma verdade que lhe era escondida pela distância.

Pelo que, ao longo de toda a carreira, o que o Burial tem tentado fazer é regressar a esses tempos em que havia uma verdade passível de ser alcançada, assim que as condições materiais fossem favoráveis. Como essa verdade já não existe - culpa da gentrificação, das dores de crescimento ou do facto de o jungle já não ser modinha como o foi durante um certo período dos anos 90 - cada malha que ele produz age como uma espécie de lamento por um ideal, ora não concretizado, ora engolido pela máquina, não só a do capital como a do tempo. Uma lágrima nostálgica por um período em que os teus amigos, os meus amigos, os amigos dele constituíam uma sociedade dentro da sociedade, e que desaparece assim que esses mesmos amigos crescem, arranjam empregos, conhecem outras pessoas, têm filhos e só te veem um par de vezes por ano.

Mas onde é que eu ia, ou onde é que eu queria ir, antes de começar a escrever esta patacoada, que é também ela uma fuga ao ennui que estava a sentir num dia suburbano, frio de inverno, depois de ter despachado trabalho mal pago?

Ia falar do "Antidawn". Que é o novo EP do Burial, ainda que com 40+ minutos mais se assemelhe a um longa-duração (e isso é outra discussão e, diga-se de passagem, é uma merda de discussão: quem é que quer saber?). E que, ao contrário de tudo o que ele já fez, não é genial. Bem, o "Rival Dealer" também não era. Mas este consegue algo que até agora a música do Burial não (me) tinha provocado: sono.

Sem dúvida que será a ausência do beat - coisa também ela romantizada e equiparada aos nossos próprios ritmos cardíacos - que leva a que "Antidawn" não seja o regresso que esperava, ainda para mais quando foi precedido por duas das melhores faixas que ele fez desde o já mítico "Untrue": a 'Chemz' e a 'Dark Gethsemane'. O problema é mesmo o sono que cinco faixas ambientais provocam, e a recusa do Burial em ser aquilo que é (aquilo que eu espero que ele seja): o gajo do subúrbio, e não o próprio subúrbio, não a antropomorfização do local onde o tempo não é parado mas, pior ainda, corre extremamente devagar, à semelhança de todas as cinco faixas aqui presentes. Se ele passa a ser o próprio espaço, se se deixa engolir, para onde é que remeteu a sua capacidade de sonhar com outros mundos? Para onde foi o ritmo das fábricas e dos carris, o que aconteceu à estrada que eventualmente o levaria ao jungle ou às raves ou a outra coisa qualquer?

Mas talvez eu esteja a ser injusto e "Antidawn" seja apenas a conclusão lógica de tudo aquilo que ele já fez, o álbum chill out no fim da rave, de forma a que as drogas que consumiste desapareçam suavemente do teu sistema e não à cacetada do dia que nasce (daí o título). Talvez tenha sido, pela primeira vez, um trabalho propositado e não, à semelhança dos outros, algo nascido da espontaneidade - de um pensamento único, de uma vontade de escapar. O que explicaria o facto de este EP ter sido precedido por uma nova fotografia do homem, boca escondida mas sorriso detectável no meio da neve.

"Antidawn", pese embora todas as suas falhas, é provavelmente o primeiro disco em que o Burial se decidiu ocultar de vez, impedindo, através da transformação total da sua paleta sonora - agora reduzida à crueza das vozes sampladas e nada mais - quaisquer romantizações passadas, salto gigante neste parkour do gato e do rato que anda a alimentar desde que assinou pela Hyperdub. O que seria, no fundo, uma jogada genial e uma chapada na tromba de todos os anormais de óculos de massa com camisolas pretas que acham que conhecem a pessoa sobre a qual escrevem.

Foda-se, afinal não compreendo o Burial. Mas adoro-o.

sexta-feira, 22 de janeiro de 2021

Tiago Silvestre - Pela Estrada Fora

 



De toda a merda que a Flor Caveira e semelhantes despejaram sobre o mundo (e foi muita, ainda que algumas coisas de lá saídas tenham despertado algum interesse), nenhuma fede tão miseravelmente quanto a ideia de que qualquer gajo pode vir a ser um músico com boa imprensa desde que cante em português e tenha as referências certas: os beats, o Bukowski, o B Fachada. Tiago Silvestre tem duas dessas referências. A outra ficou de fora, porque quem nasceu para fancaria nunca chegará a ser fachada.

Regra geral nem me daria ao trabalho de ouvir um disco que me chegasse à caixa de entrada do Gmail, com um título sacado ao Jack Kerouac - sendo que "Pela Estrada Fora" é o romance de eleição de todos os tipos com a mania que são livres e inteligentes quando não passam de alcoólicos agrobetos -, mas dei uma oportunidade a este porque calculei que fosse uma merda do caralho e, nesse sentido, não posso dizer que tenha ficado desiludido. Um dos meus cocktails musicais de eleição mistura masoquismo, schadenfreude e um sentimento de vergonha alheia. Porque esse tipo de álbuns me faz sempre rir, numa onda de como é que este gajo teve a coragem de fazer isto?

Glória eterna a Tiago Silvestre, então, por ter tido um valente par de tomates em tempos de estrogénio. "Pela Estrada Fora" não é só o pior disco que provavelmente ouviremos este ano (as melodias básicas, a voz do próprio - como se estivesse não a cantar, mas a ler, com entoações diferentes, de um qualquer teleponto), como contém provavelmente o pior verso que alguém irá escrever na língua de Camões durante muito, muito tempo: «os teus lábios aquecem como vodka neste inverno gelado», retirado a 'Baby Doll'. E atenção que eu tenho visto os directos do Bruno Nogueira. Sei bem o que são maus versos.

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

We Bless This Mess - Enlightened Fool

 

Quando ouço falar em "rock português" pego logo na pistola, quer esse "rock português" se refira à mediocridade que é ter o Rui Veloso ou os Xutos & Pontapés como o seu estandarte, aos pseudo-bardos lisboetas que competem entre si para ver quem utiliza a palavra menos óbvia e mais esdrúxula, ou aos expatriados que não resistem a acrescentar um sotaque ao seu oh-tão-maravilhoso-inglês. 

Bem, se calhar o que odeio mesmo é o rock, ou os portugueses. Só me falta é a pistola.

We Bless This Mess é um projecto de um expatriado, que achou por bem acrescentar uma mensagem de agradecimento ao(s) ouvinte(s), em bom inglês com sotaque tuga: «obrigado por existirem», diz ele. Obrigado é o caralho, que eu não pedi nada, e quanto mais depressa me tirarem daqui melhor - que eu sou demasiado cobarde para me suicidar.

"Enlightened Fool" é, para We Bless This Mess - em formato banda; creio que o vi a solo no Lounge quando ainda podíamos sair de casa, mas honestamente não me lembro; a abrir para Emperor X? -, uma "celebração de estarmos vivos", pelo que o título do disco faz absoluto sentido: só um pateta poderia celebrar essa merda. E, no entanto, há ali qualquer coisa escondida no emo-punk épico de pendor americano. 

Até eu, que nunca fui punk tirando nas ideias, consigo esboçar algo semelhante a um sorriso a ouvir os coros de 'Find.Unfold.Accept', e uma certa vontade em continuar nesta enorme demanda que é chegar a tempo da reforma e de insultar tudo e qualquer coisa que os jovens de então façam. Até tive de ouvir o disco duas vezes, algo expressamente proibido a um crítico de música, para o confirmar: isto é verdadeiramente decente ou, pelo menos, melhor que qualquer coisa que os tugas do eixo indie-Arroios andam a defecar há largos anos. Metam We Bless This Mess no palco de Coura (se alguma vez isso puder voltar a acontecer) e vejam a coisa a rebentar.

Jute Gyte - Diapason

 

Toda a gente sabe que o drone e o black metal andam de mãos dadas. Num minuto estás a gritar bem alto por Satanás e a gastar rios de dinheiro em material da Kiko Milano, no outro queres alinhar os teus chakras e abrir um restaurante vegan para misantropos com +3.5 dioptrias e barba pálida do vaping.

Jute Gyte, nome com o qual Adam Kalmbach assina a sua música, é um desses casos. À semelhança de tantos outros artistas dentro do black metal (e a culpa deve ser do Varg, que tem as costas largas e nunca escondeu curtir technão), Kalmbach tem a música electrónica como influência, havendo quem o compare a Aphex Twin em determinados discos que não ouvi, porque só tive paciência para o "Perdurance" e mesmo esse é uma salganhada inaudível até para quem ama noise.

Seja como for, um tipo que lança um ou dois discos por ano vai acabar por se tornar chato a dada altura - razão pela qual os King Gizzard não são assim tão bons e vocês são todos uns idiotas, e razão pela qual não há mesmo forma de defender "Diapason", que é o registo que me levou a ter vontade de escrever estas linhas. A não ser que queiram sentir a vossa sanidade mental a definhar ao longo de duas horas e meia, mantenham-se longe deste disco. Já vou no minuto 47 de um tom monótono e nunca senti tanta vontade de estoirar os miolos, nem quando me espalhei ao comprido na SportZone do Vasco da Gama, nem quando o João Félix espetou dois no Dragão. Esta música não é para duros, é mesmo para surdos.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

Grimes - Miss Anthropocene (Rave Edition)

Quase um ano após editar "Miss Anthropocene", a nossa traidora de classe favorita volta à carga com... uma versão "rave" desse mesmo álbum. "Rave", entre aspas, que muito provavelmente Grimes nunca foi, como toda a gente nascida pós-1991, a uma rave à séria (drogas, loucura, morte). 

Se é verdade que a coisa até começa bem - cortesia de ANNA e Richie Hawtin - o resto soçobra perante a falta de inventividade presente em cada uma das remisturas. Mas a culpa é minha, que estava à espera que um disco de remixes fosse bom. É que há duas formas de fazer a coisa: ou se mantêm fiéis ao registo original, acrescentando-lhe apenas uma tarola aqui e um bombo ali (e toda a gente fica feliz porque toda a gente ganha royalties), ou adoptam a táctica Aphex Twin, cagam no som de base, e (des?)constroem uma canção do zero (e toda a gente fica feliz porque toda a gente ganha royalties, mas ao menos passam por ÍNTEGROS). 

A culpa é d@s tip@s que assinam as remisturas, claro, mas também é da própria Grimes, que nunca na vida deveria ter dado o ok ao lançamento de um álbum "rave" numa altura em que até aquilo que hoje em dia passa por "rave" (espaços controlados, patrocínios de grandes marcas, os mesmos DJs a tocarem os mesmos BPMs) está parado porque, bem, há um vírus chato à solta. Talvez depois da vacina isto soasse menos aborrecido. Talvez Julian Bracht tivesse conseguido não assassinar a melhor malha de "Miss Anthropocene". Talvez os Modeselektor tivessem feito algo que não perturbasse o seu vasto legado de qualidade. Mas parece que nunca o saberemos.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Pão com Manteiga



IMAGEM DESENVERGONHADAMENTE ROUBADA

Na passada sexta-feira a Trem Azul recebeu a festa de lançamento da Videoteca do Bodyspace. Uma noite que se veio a verificar épica, mesmo que não tenha tido a aceitação do público (a.k.a. faltaram gajas) que se desejava. Mas valeu, não só pela belíssima folha A4 colada na porta onde em Arial Black se lia FESTA PRIVADA, mas também pelos dois concertos a que se teve o privilégio de assistir à borla. Então:

Os Pão. Os Pão escolheram um nome tão OH EXPLOITABLE que por vezes esquecemos que também são músicos. Cozinham aquilo que se pode chamar de "improvisação livre" a não ser que sejamos professores na FCSH. A partir de alguma electrónica, de um saxofone e de um piano constroem um verdadeiro apocalipse, nem superado pelas imagens de vulcões que passavam ao lado. Não raras vezes me encontrei de boca aberta a engolir toda aquela arrepiante sonoridade. E decidi nunca mais gozar com o nome; sabe-se lá o que me podem fazer no futuro.

E os Sunflare. Parece que o nome se escreve em ALL CAPS mas eu não quero saber. Com eles já se sabia ao que se ia: ruído, riffalhada, gasolina bruta e inflamável que até serviu, no soundcheck, para assustar um pobre cãozito que por ali passava. São tão grandes como o astro, e o cabrão do astro entra-nos pelos tímpanos dentro - tímpanos esses que o caríssimo vocalista não me quis devolver no final - e rebenta-nos com o cérebro. São tão grandes. São tão, mas tão grandes.

Claro que tem de haver uma menção honrosa para os DJs com que se acabou a noite, que fizeram rodar malhas dos Comets On Fire até Demis Roussos, passando pela mui fantástica ideia de colocar a aberração de nome Friday, dançada por três meninas que não se quiseram identificar. O que é sempre uma pena. Mas acreditem, por detrás deste rosto de sapo está uma personalidade ainda pior de ouro. Não sejam tímidas.